A Morte: o primeiro novíssimo
A palavra morte nos faz lembrar muitos sentimentos negativos, como dor e separação, entre outros. Nossa experiência cotidiana com esse termo, naturalmente afasta de nós qualquer desejo por essa realidade. E isso é normal, pois fomos criados para a vida e não para a morte. Na luz da fé, a morte entrou na humanidade como conseqüência do pecado original, e o homem iniciou uma vida de sofrimento e infelicidade. Porém, em Jesus Cristo, Deus feito homem, a morte foi abraçada e derrotada no alto da cruz, recebendo um novo sentido para todos nós que cremos na sua ressurreição. Como nos diz Santa Teresinha: “Eu não morro; entro na vida”.
Assim, a morte é o fim da peregrinação terrestre do homem, do tempo da Graça e da Misericórdia que Deus oferece para que realizemos nossa vida segundo Seu projeto e para que seja decido nosso destino último.
Logo após a morte, o ser humano sai da temporalidade e torna-se incapaz de viver uma nova vida terrena (reencarnação), ou fazer uma opção acerca do seu destino. Ensina-nos a sã doutrina da Igreja que a alma humana recebe de Deus uma iluminação intensa imediatamente após a sua separação do corpo, revelando plenamente o valor e o sentido real da sua existência terrestre.
O homem encontra-se com sua mais plena verdade diante do seu Criador, e “recebe, na sua alma imortal, a retribuição eterna logo depois da sua morte, num juízo particular que põe a sua vida na referência de Cristo, quer através duma purificação, quer para entrar imediatamente na felicidade do Céu, quer para se condenar imediatamente para sempre” (Cat 1022). Por isso é importantíssima a assistência àquelas pessoas que estão “aparentemente” próximas do seu momento final, a fim de prepará-las conscientemente para uma opção última e decisiva com relação ao seu destino eterno.
Mas esta orientação também diz respeito a todos os demais que gozam de perfeita saúde, pois nós não sabemos nem o dia, nem a hora em que seremos convidados à presença do Pai. É importante estarmos diariamente nos preparando para este encontro tão importante.
O Livro do Eclesiástico contém um conselho fundamental para nossa salvação: “Em todas as tuas obras, lembra-te dos teus novíssimos, e jamais pecarás (Ecl. 7, 40). Assim se recordamos sempre da morte, do juízo, do céu e do inferno jamais pecaremos. Se o mundo anda tão mal, é porque pouco se medita ou mesmo não se cogita seriamente sobre os Novíssimos. Os Santos, no entanto, não só os tinham sempre presentes, mas também pregavam sobre eles aos outros. Um deles foi o grande Santo Afonso Maria de Ligório, Doutor da Igreja e grande moralista.
Aos 22 anos, formado em Direito Civil e Canônico e um dos mais promissores advogados de Nápoles, tudo abandonou, após um lapso involuntário na defesa de uma causa judicial, para entregar-se às pregações populares.Fundou a Congregação do Santíssimo Redentor e escreveu inúmeras obras. É de sua famosa Preparação para a Morte que extraímos trechos que versam sobre os Novíssimos, começando hoje com a morte.
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“Considerai que sois pó, e que em pó vos haveis de tornar. Virá um dia em que morrereis e sereis lançado à podridão num fosso, onde o vosso único vestido serão os vermes. Tal é a sorte reservada a todos os homens, aos nobres e aos plebeus, aos príncipes e aos vassalos. Logo que a alma saia do corpo com o último suspiro, dirigir-se-á à eternidade e o corpo deverá reduzir-se a pó.
“Imaginai que estais vendo uma pessoa que acaba de exalar o último suspiro; considerai esse cadáver deitado ainda no leito, com a cabeça pendida sobre o peito, os cabelos em desalinho banhados ainda nos suores da morte, os olhos encovados, as faces descarnadas, o rosto acizentado, a língua e os lábios cor de ferro... o corpo frio e pesado. Empalidece e treme quem quer que o vê. Quantas pessoas, à vista de um parente ou de um amigo morto, não mudaram de vida e não deixaram o mundo!
“Mais horrível ainda é o cadáver quando principia a corromper-se. Há apenas 24 horas que esse moço morreu, e já o mau cheiro se começa a sentir. É preciso abrir as janelas e queimar incenso; é preciso quanto antes enviar esse corpo à igreja e entregá-lo à terra, com receio de que venha a infeccionar toda a casa. ....
“No que se tornou esse orgulhoso, esse dissoluto! Ainda há pouco acolhido e desejado nas sociedades, agora objeto de horror e de desgosto para quem o vê! .... Há bem poucos instantes ainda, não se falava senão do seu espírito, da sua polidez, das suas belas maneiras, dos seus bons ditos; mas apenas está morto, já se perdeu a lembrança de tudo isto. ....
“Pensai bem que, assim como vós fizestes na morte dos vossos amigos, assim os outros agirão convosco. Os vivos entram para aparecer por sua vez na cena, ocupando os bens e os lugares dos mortos, e destes já não se faz ou quase não se faz caso ou menção. ...
“Na morte é preciso deixar tudo. O irmão de Tomás de Kempis, esse grande servo de Deus, felicitava-se por ter construído uma casa magnífica. Houve porém um amigo que lhe notou um defeito. ‘Onde está?’ – perguntou ele. Respondeu-lhe o amigo: ‘O defeito que lhe acho é terdes vós mandado construir nela uma porta’. ‘O quê! Uma porta? Pois isso é defeito?’. ‘Sim – acrescentou o amigo – porque um dia, por essa porta, devereis sair sem vida, e assim deixar a casa e tudo o mais’.
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